sexta-feira, 30 de julho de 2010

A Gália ocupada pelos romanos

Travando uma dura campanha militar que se estendeu por sete anos, Julio César, pró-consul romano da Gália Narbonense, entre 58 e 51 a.C., conseguiu submeter as 60 tribos celtas que habitavam as três partes da Gália original.




Desde então, cessada a resistência nativa ao redor do ano 50 a.C., teve início o lento processo de absorção dos derrotados pelos vencedores. Política que continuou se prolongando com sucesso pelo império de Otávio Augusto e de Tibério Cláudio.

O começo da conquista

Independentemente de César ser um homem ambicioso. Desejoso de fazer fama nos combates e nas aquisições territoriais fazia tempo que os romanos olhavam cobiçosamente para a Gália. Ainda que ela se apresentasse extremamente dividida (Bélgica-Aquitânia- e Gália propriamente dita), com suas 60 tribos se desentendendo e sendo rivais, ela era uma ameaça permanente a fronteira norte da Itália. Além de possuir enorme riqueza agrícola e mineral, bem como prodigiosa criação de gado, tinha uma notável rede de rios navegáveis, tais como o Ródano, o Garona, o Loire, Mosele, Reno, Oise, Saône, Somme, Sena, etc., apresentava-se, pois, como uma questão de segurança.

Tanto assim que foi daquelas terras de onde partiu a maior ameaça que Roma sofreu em todos os tempos: a impressionante campanha de Aníbal Barca, o general cartaginês que por pouco não pôs fim à própria Roma, quando invadiu a Itália em 218 a.C.. Portanto, os estadistas romanos estavam sempre à espreita de uma oportunidade de rumarem com suas armas para o norte e colocar a Gália inteira sob sua tutela. César narrou no De Bello gallico (‘Comentários sobre a Guerra Gálica’, Livro I,) que foi atendendo ao chamado dos celtas que terminou por envolver-se na guerra.

Entrou em ação a pedido dos galos-sequanos para neutralizar o chefe germano Ariovisto que assolava a região e a partir de então suas legiões não pararam mais de marchar e lutar até que todo o território celta ficasse submetido. Sua força núcleo compunha-se das legiões Claudia (VII legião), Augusta (VIII legião), Hispana (IX legião) e a Gemina (X Legião), num total de 24 mil combatentes, fora os 12 mil das tropas auxiliares. Seu objetivo era impedir por meio militar que o líder suevo implantasse, como era o intento dele, uma Gália Germânica na parte setentrional da França de hoje (pois ela poderia servir como trampolim para futuras incursões dos bárbaros sobre a área controlada pelos romanos).

A guerra que os dois deram começo, em setembro do ano de 58 a.C., com a vitória espetacular de César nos Vosges (batalha de Ochsenfeld, para os alemães), nas proximidades de Mulhouse (hoje na Alsácia), foi a primeira de uma série travada entre romanos e germanos que se estendeu por séculos e que tinha como alvo o domínio da Gália, até quando os francos sálicos(vindos da Francônia alemã) a ocuparam definitivamente no século V, fundando a França moderna.


Campanha militar de Julio César na Gália.

Nesta impressionante operação, agindo numa área imensa, quase duas vezes superior a da Itália, suas coortes combateram os helvécios, os germanos e, também, ao atravessar o canal da Mancha para invadir a Bretanha, no ano de 54 a.C., as tribos bretãs. Depois de ter batido os germanos, teve a seu favor o fato dos celtas não possuírem um governo central. A Gália subdivida-se entre as tribos marítimas, as da Gália central e da Bélgica, mostrou-se incapaz de fazer uma frente comum contra o romano invasor.

A maior resistência à ocupação partiu do chefe Vercingetórix, bravo filho de Celtilo Arverno, que, conclamando as demais tribos gaulesas (senones, parísios, pictones, cadurcos, turonos, aulercos, lemovices, andes, etc.), lutou heroicamente contra o cerco romano em Alésia até que viu-se constrangido à rendição no ano de 52 a.C., não suportando o sitio e a fome que as legiões lhe impuseram.

A Gália Narbonense

César na sua conquista não partira da Itália e sim da Gália Narbonense, também conhecida como Gália Transalpina, região que desde 120-118 a.C. fazia parte do Império.


Ruínas de uma antiga via romana em Narbone;
Narbone, foi a primeira cidade romana na Gália.

Aquela margem do Mar Mediterrâneo que ligava a Ligúria à Espanha, dos Alpes aos Pirineus, que os franceses hoje denominam genericamente como Languedoc-Roussinon/ Provence, durante muito tempo foi hegemonizada pela cidade-estado de Marselha (fundada pelos gregos fócios em 600 a.C. sendo assim a cidade mais antiga da França), que matinha relações de amizade e dependência para com Roma. Todavia, razões geopolíticas fizeram com que os romanos, na esteira da última guerra púnica, a de 146 a.C., se decidissem por implantar uma colônia na região. Foi assim que nasceu a vila de Narbo Martius fundada pelo cônsul Aenobarbo Cneu Domitio que logo se lançou na construção de uma obra histórica.

O intento deles era não só fixar-se no sul da Gália – que passou a ser designada como Província Nostra, ou simplesmente Provence - como também abrir uma estrada da Itália alpina à Espanha pirenaica, rota que passou a se chamar de Via Domitia, cujos começos datam de 118 a.C.. Dali mesmo, de Narbone, outro longo caminho foi planejado, visando à ligação dos dois mares, o Mediterrâneo com o Atlântico, denominada de Via Aquitânia.

Para proteger sua aliada Marselha das incursões bárbaras que a ameaçavam, o general Sextus Calvinus fundou Aquae Sextiae, no ano de 120 a.C., há 30 quilômetros de distancia ao norte dela, oppidum que veio a se tornar mais tarde na famosa Aix-en-Provence, agradável local de repouso e veraneio, prodigiosamente provido de águas quentes salutares.

Ali é que, em 102 a.C., poucos anos depois da sua fundação, se travou a lendária batalha de Aquae Sextiae entre o cônsul romano Caio Mario e os Kimber, teutões-cimbrios, que foram derrotados. Desastre que culminou no suicídio em massas de 300 mulheres germanas e seus filhos que não aceitaram ser escravizadas pelos vitoriosos. Esta batalha garantiu em definitivo a posse do espaço Narbonense pelos romanos, província que serviu como base e ponto de partida para o grande assalto ao país dos celtas ensejado por César meio século depois.

A política da ocupação

Octávio Augusto, tornado princep et imperator pelo Senado, no ano de 27 a.C., deu seguimento a política de César em integrar os gauleses ao projeto de domínio romano. Para os nobres celtas ele ofereceu posições de mando na administração e na magistratura, fazendo deles novos cidadãos do império com direito a pertencer ao cursus honorum, e para os jovens guerreiros gauleses, cheios de energia e vigor, abriu-lhes as portas do serviço militar, particularmente na arma da cavalaria.


Teatro romano de Orange, França.

Transformou a cidade de Ludgunun (Lyon) no centro da Gália federada, fazendo com que anualmente delegações de representantes tribais, presentes na Dieta, viessem prestar homenagens à pessoa do imperador, tornado culto sagrado. Estas reuniões podem ser consideradas como o embrião histórico da assembléia nacional francesa. Lentamente notou-se a alteração dos costumes, os ‘gauleses cabeludos’ deram lugar a uma população galo-romana que gradativamente foi sendo introduzida nos hábitos e costumes trazidos pelo invasor. Uma nova língua começou também a ser falada.

Ainda que rude e impreciso, foi na Provence que, desprendendo-se do latim vulgar, o provençal (ou occitano), pai do idioma francês, derivado da Língua Romana Rústica, conheceu seus primeiros avanços. (*) Administrativamente a Gália foi divida em quatro partes: Aquitânia (com capital em Bordeaux), Belga ( capital em Tréveris), Ludgunense (capital em Lyon) e Narbonense (com capital em Narbone), chamada mais tarde de Septimania. O antigo sistema cantonal dos celtas foi definitivamente substituído pelo municipia romano.

Divisão da Gália Romana

Aquitânia - Bordeaux

Ludgunense - Lyon

Belga - Tréveris

Narbonense - Narbone

Todavia, coube ao imperador Tibério Cláudio, que nascera em Lyon, em 10 a.C., adotar uma política mais afirmativa no sentido de distribuir a cidadania romana ao número mais amplo possível de gauleses. Nada lhe parecia melhor para a proteção das fronteiras – talvez por sugestão do seu preceptor o historiador Tito Lívio - do que a participação dos nativos, agora cada vez mais integrados e comprometidos na estabilidade do império.

Neste aspecto, foi importante a campanha romana contra a ilha da Bretanha, comandada pelo general Aulo Plaucio, em 43, visto que Claudio estimulou-a como um elemento fundamental para estreitar a confraternização militar entre romanos e gauleses, escolhendo os bretões como inimigo comum. Ao atrair a nobreza nativa (que adotou o tria nomina do cidadão romano) e interferir o mínimo possível nos usos e costumes locais (proibiu-se, todavia, os sacrifícios humanos), dando a maior autonomia possível aos municípios gauleses ( só lhes extraindo impostos extraordinários em caso de emergência), Roma não conheceu mais atos de rebeldia na região.

Os governadores provinciais e seus agentes foram instruídos em servirem mais como árbitros dos conflitos entre as cidades federadas ou entre as tribos rivais e não como representantes de uma máquina repressora. E, claro, manterem os privilégios e regalias dos comerciantes romanos na área.

Verifica-se em retrospecto que a romanização da Gália foi um dos mais bem sucedidos projetos de colonização almejados pelos Césares na ocupação da Europa Ocidental.

Fonte: Educaterra


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