domingo, 10 de janeiro de 2010

A normalidade da violência em Roma

Para o gladiador dor e morte deixavam de ser coisas terríveis para se tornar parte corriqueira da vida. Honra e vergonha são palavras-chave para entendermos a paixão romana pela arena




Os jogos de gladiadores fornecem um bom exemplo dos intrincados percursos sociais do espetáculo no mundo romano. As disputas de gladiadores eram um fato normal da vida cotidiana havia muito tempo. Durante o Império, os combates de gladiadores aumentaram de freqüência e se difundiram por todo o mundo romano. Surgiu um tipo especial de edifício, o anfiteatro, que funcionava como palco das lutas entre gladiadores e de outras formas de espetáculo. Em Roma, assim como nas províncias, as lutas de gladiadores estavam sempre ligadas à pessoa do imperador. Era ele que as oferecia em Roma e, nas províncias, eram os sacerdotes do culto imperial os responsáveis por sua realização. Os anfiteatros eram uma espécie de microcosmo da sociedade romana, como parte e reflexo do cotidiano. Os assentos eram repartidos segundo as classes da população, e o próprio anfiteatro era um local onde a população não apenas via, mas se fazia ver e ouvir, no qual imperador e plebe, dirigentes e dirigidos se confrontavam face a face, onde o anonimato da massa conferia força e consistência para o apoio ou para as reivindicações da plebe. Nesse espaço, sagrado e mundano, as lutas entre gladiadores ocupavam um lugar especial.

O anfiteatro era, para os romanos, parte de sua normalidade cotidiana, um lugar no qual reafirmavam seus valores e sua concepção do “normal”. Nos anfiteatros eram expostos, para serem supliciados, bárbaros vencidos, inimigos que se haviam insurgido contra a ordem romana. Nos anfiteatros se supliciavam, também, bandidos e marginais, como por vezes os cristãos, que eram jogados às feras e dados como espetáculo, para o prazer de seus algozes ou daqueles que defendiam os valores normais da sociedade.

Mas os combates de gladiadores ocupavam um lugar à parte, um lugar de honra. Embora, de início, os gladiadores tenham sido, em sua maioria, prisioneiros de guerra ou escravos, na época do Império boa parte era de origem livre, os auctorati, que se ofereciam como gladiadores, colocando-se sob o poder de seu mestre (o lanista), ao qual prestavam juramento sagrado.

Esse juramento transformava o gladiador num ser para o qual a dor e a morte deixavam de ser ameaças terríveis para transformar-se em parte corriqueira da vida: um simples momento, o momento da verdade, que deixava de ser objeto de angústia para se tornar objeto de honra. Honra e vergonha são palavras-chave para entendermos a paixão que os gladiadores suscitavam no mundo romano. O gladiador vencido, em vez de lutar inutilmente pela vida, oferecia graciosamente o pescoço a seu adversário e à platéia. Transmutava, assim, a vida num combate glorioso, cujo fim, necessário para todos, podia ser uma morte digna. A figura do gladiador era um belo espelho de realização humana, um modelo para filósofos e religiosos. Não era o massacre, a vista do sangue, a dor alheia que seduziam os espectadores, mas um uso, todo próprio, todo especial, todo romano, do que nós mesmos consideramos uma violência absurda.

.:: História Viva

Um comentário:

Ajk AHassen disse...

Interessantíssimo voltarmos na História Romano estes tipos de crueldades que se faziam em seus anfteatros. Pace-me que ao imaginar cenas, como decepar a cabeça como um trófeu, ou mesmo pessoas que eram atiradas vivas para serem comidas por leões, isto gera em nós certa repugnação.
Mas, estamos em pleno século 21, os mesmos anfiteatros em diversas facetas da sociedade são muito atuais. Hoje somos capazes de tirar a vida de outros por muito pouco e, isto não nos trás glórias ou orgulho, mas muita VERGONHA como seres humanos.
Espaços onde os imperadores roubam e matam os plebeus, de fome, sede, pois os mesmos roubam o que não lhes pertencem e tentam esconder-se por trás de um véu sujo, transparente, tentando através do véu adquirir sua glória e honra, o sistema da política em nossa sociedade no mundo.
Então questiono-me: Não estamos repetindo os feitos de Roma e sua história e cultura da sua época? Que diferença existe entre este dois períodos tão distantes no tempo e espaço, onde nossas ações talvez sejam mais bárbaras, ou não da época do Império Romano?
Façamos esta "REFLEXÃO"
Acreano Hassen